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O BLACKOUT


Mauro Rocha

A noite seria perfeita. A mesa estava pronta com vinho. O cardápio seria macarrão ao alho e óleo com camarão. Aquele seria o primeiro encontro e na emoção o perfume derramou um pouco mais na roupa, um cheiro doce de madeira, mas nada que ficasse impregnado, o cabelo estava cortado e a barba feita, era só esperar, não tinha erro que a noite seria perfeita.

De repente tudo ficou escuro, parecia que dois caminhões tinham se chocado, mas era um trovão seguido de um raio e um blackout, a cidade estava às escuras, e o que mais poderia acontecer? Veio o temporal. Não, não era verdade tudo aquilo, ele pensou no encontro, um mês planejando, planilha fechada, tinha até presente, parecia dia dos namorados e nem era, mas aquela escuridão... Havia uma esperança de ter notícias ou mandar alguma, correu foi ao celular sem bateria.

Será que ela estava no meio do caminho? Será que ela também ficou presa em sua casa por causa da escuridão? Ela mora do outro lado da cidade, havia três meses que eles se conheceram, por causa de um amigo do primo dele que estava no shopping quando todos se encontraram e ela estava no rolo, morena, olhos castanhos, corpo de deusa, amor à primeira vista, a segunda vista... E agora aquela situação e o jantar esfriando e nem a lua para salvar o brilho da noite. O silêncio tomou conta da sala.

Um barulho na porta. Coração acelerado. Será que ela conseguiu chegar, será que a noite não está tão perdida assim, as pernas bambas de nervoso, o caminho até a porta parecia uma eternidade, havia chumbo nas pernas? O giro na maçaneta, a porta aberta, um grito!

— Maldito gato! Quer me matar do coração! Uma semana sem pastinha!

O gato estava na escada que leva para o quarto andar e ao ver a porta aberta pulo para dentro do apartamento fazendo com que seu dono fosse para trás e caísse no sofá próximo à porta.

Depois de controlar a respiração daquele agito todo, sentado no sofá, verificou as horas no relógio da parede com uma luz de um fósforo, achado por acaso no chão, e ver que o tempo correu tanto dentro da escuridão que seu desanimo lhe mostrava que só havia uma coisa a fazer, comer. Não dava para desperdiçar aquele macarrão e principalmente o camarão e para dormir melhor umas boas doses de vinho do porto.

Afinal todos os pensamentos de raiva e todos os xingamentos provocados pelo blackout já tinha sido processados e não tinha muita coisa a fazer que não fosse esperar pela manhã, o dia seguinte é outra história e quem sabe um dia ele não iria rir de tudo, mas naquele momento tudo o que ele queria era a chave do tempo para mudar os acontecimentos, projetar aquela noite numa bela noite estrelada de outono com direito a brisa de primavera e uma lua cheia de calor num dia repleto de verão.

O temporal estava começando a cessar e o que se ouvia muito era as sirenes pela cidade. Policia? Bombeiros? Ele não queria saber, apenas olhava para a janela um pouco aberta onde entrava um vento frio e seus olhos já pesados se entregaram a um sono tranquilo anestesiado pelo vinho e a madrugada era quebrada pelo sol que atravessava a janela num calor de dez horas de um sábado, se fosse um dia qualquer da semana ele com certeza teria uma correria para chegar menos atrasado, mas em sua cabeça, se tudo tivesse dado certo seria um atraso bem justificado. Ele olhou para a mesa posta, a garrafa de vinho pela metade o gato miando de fome e alguém batendo na porta. Levantou como se tudo fosse um pesadelo e foi se arrastando para abrir a porta...

— Bom dia, Sr. Alfredo!

— Bom dia, Sr. Eduardo! Só vim entregar o jornal e pelo visto a noite foi boa.

— Obrigado Sr. Alfredo e tenha um bom dia.

Seu celular estava carregando quando toucou, era ela. Pensou ele, correu, quase tropeça na almofada no chão...

— Alô!

— Alô querido! Tudo bem?

— Tudo bem? Que chuva e que apagão!

— Pois é! E fiquei presa no transito nem consegui sair da quadra, te liguei várias vezes e nada, fiquei preocupada.

— Meu celular ficou sem bateria, mas não tem problema vamos marcar algo para hoje.

— Então... Queria te falar isso, viajo hoje para Nova York por causa de um curso e só volto daqui a seis meses… adorei te conhecer, quem sabe na volta.

— Na volta...

Ele olhou para o vinho, estava pela metade...

 
 
 

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